sexta-feira, 9 de junho de 2017

Mais sombras negras sobre o modelo padrão!

Quem andou lendo as postagens mais antigas por aqui, já ouviu falar bastante do Modelo Padrão - a "teoria de quase tudo" que junta todas as interações fundamentais, menos a gravidade.

Desde a descoberta do Bóson de Higgs, pelo menos por três vezes (aqui, aqui e aqui) discutimos resultados recentes que pareciam desafiar as previsões do modelo padrão (ainda que a última delas, a "quase descoberta" de uma nova partícula pelo "excesso de difótons de 750 GeV" tenha se mostrado um engano)...

Essa semana, surgiu mais uma pesquisa que parece desafiar as previsões do modelo padrão: três laboratórios diferentes (um nos EUA, um na Suíça e um no Japão) identificaram um mesmo comportamento na interação de uma partícula chamada "tau" - a irmão "pesadona" do elétron (além das duas, há o "irmão do meio", o múon).

Acontece que o tal Modelo Padrão diz, com todas as letras, que esses três irmãos têm que interagir de forma exatamente igual com as outras coisas, apesar de terem massas e meias-vidas (a "duração") muito diferentes - isso é chamado de "universalidade de léptons". O elétron é super bem conhecido, e o múon já foi estudado de todos os jeitos, sempre confirmando a previsão. O tau, por outro lado, é super difícil de produzir, então não era tão bem estudado assim... 

Aí entram em cena os superaceleradores de partículas atuais, e sua capacidade enorme de examinar a natureza de jeitos nunca antes vistos... Entre eles, três experimentos procuravam exatamente examinar o comportamento desse tal tau (trocadilho ruim esse, não?). E os resultados dos três experimentos mostra a mesma coisa: parece que o tau interage mais fortemente que seus dois irmãos menores - o que viola a tal "universalidade" e, por sua vez, bate de frente com o que diz a teoria mais aceita do mundo...

Os resultados dos três laboratórios, combinados, dão 99,5% de certeza de que o tau interage mais fortemente que os outros dois (em linguagem estatística, isso são 4 sigma) - mas, pra ciência, isso ainda não é o bastante pra bater o martelo, a regra é exigir 99,9% de certeza (a "regra dos 5 sigma"). Isso significa que vamos continuar medindo, de preferência de alguma forma diferente (pra evitar erros sistemáticos - ou seja, erros "de projeto" da medida), até chegar lá.

SE chegarmos lá, os físicos de partículas vão ter um trabalho árduo pela frente, e duas opções: tentar "ajustar" o modelo padrão pra acomodar esse fato novo, ou criar um novo modelo que o substitua - e nem eles se arriscam a dizer que novos fenômenos podem/devem aparecer caso isso venha a acontecer - afinal, aqui vem algo parecido com o tal "efeito borboleta": uma pequena mudança em algum dos pilares fundamentais de uma teoria pode causar (e, normalmente, causa) uma série de conseqüências imprevisíveis!

Enfim, isso é um ótimo exemplo da ciência trabalhando do jeito que ela sabe fazer: questionando (com medidas experimentais reprodutíveis!) até mesmo as teorias mais bem estabelecidas, mas exigindo um altíssimo grau de confiança antes de afirmar qualquer coisa.

Até mais!!!